“O remorso é uma impotência, ele voltará a cometer
o mesmo pecado. Apenas o arrependimento
é uma força que põe termo a tudo.”
(Honoré de Balzac)
Considerações gerais
Boa parte dos cristãos acredita que o ato de arrependimento por um pecado ou erro cometido se resume ao pedido de desculpas (ou perdão), ou nem isso. Alguns simplesmente tentam esquecer o ocorrido e “tocar a vida adiante”, como se nada tivesse acontecido.
Neste texto, pretendo discutir como o judaísmo aborda essa questão, possibilitando que o leitor avalie se está em sintonia com os ensinamentos passados por Cristo nos Evangelhos.
Mas, antes de adentrar especificamente no assunto, importa esclarecer que por “pecado” devemos entender o ato que contraria alguma lei ou comando de Deus. Por isso, é importante saber a qual regramento estamos sujeitos.
De maneira muitíssimo simplificada, podemos considerar que, enquanto os judeus devem submissão à Torá, os cristãos devem obediência ao Evangelho de Cristo e os muçulmanos precisam cumprir os preceitos do Alcorão. Registro apenas que esse assunto é bastante complexo e controverso.
Saliento que existem “pecados” (atitudes que contrariam os mandamentos divinos) que, além de ofender o próprio Deus, ainda prejudicam nossos semelhantes, como é o caso, por exemplo, da maledicência. Também chamo a atenção para o fato de que as leis divinas são amplas e abrangem praticamente todas as áreas de nossas vidas, assim quase sempre uma ofensa ao próximo é também um pecado para com Deus.
Teshuvá
No judaísmo, existe farto ensinamento sobre como praticar o arrependimento ou teshuvá. Segundo o rabino Adin Even Yisrael, “numa definição ampla, teshuvá é mais do que apenas o arrependimento do pecado; é um novo despertar espiritual, um desejo de fortalecer a conexão entre si mesmo e o sagrado” (Teshuvá – Um guia para o judeu recém-praticante, p. 11).
Para se ter uma dimensão da grande importância da teshuvá [arrependimento], ensina-se que, se praticada ao lado da tefilá [orações] e da tsedacá [caridade], ela tem força para garantir à pessoa um lugar de mérito na ressurreição para a Vida Eterna.
O ensinamento dos rabinos é que para haver verdadeiro arrependimento são necessárias três coisas:
Abandono do pecado
É fundamental para começar o processo de arrependimento. Pedir perdão enquanto se continua na mesma prática é inócuo e pode indicar uma provável hipocrisia.
Os rabinos afirmam que pedir perdão enquanto ainda se pratica o pecado é semelhante a mergulhar numa micvê (espécie de banheira usada ritualisticamente para purificação) segurando numa das mãos uma lagartixa (para eles, é pecado encostar num animal desses). Ou seja, a pessoa nunca se limpará de verdade enquanto não deixar de cometer aquilo que é considerado errado.
É certo que pode acontecer de a pessoa pedir perdão enquanto está verdadeiramente tentando abandonar o pecado. Nesse caso, apenas Deus, o justo Juiz, é quem julgará a sinceridade do coração.
O que sempre deve haver é a genuína intenção, com as correspondentes atitudes, de não mais cometer as práticas pecaminosas.
Reparação dos danos
É aqui que boa parte dos cristãos erra.
Como relatei no começo, muitos acreditam que abandonar o pecado e, em alguns casos, confessar o erro, isto é, pedir desculpas ao ofendido, será suficiente. Há até aqueles que, para evitar constrangimento, nem chegam a pedir desculpas, apenas passam a agir como se nada tivessem feito de errado, esperando que o tempo apague as lembranças do que fizeram.
É evidente que pode acontecer de o único ofendido ter sido Deus e, nesse caso, ser suficiente a confissão somente a Ele. Entretanto, em muitas situações o ato prejudicou também algum semelhante e, por isso, não haverá arrependimento eficaz enquanto o mal não for reparado, na medida do possível.
Digo “na medida do possível”, porque às vezes a reparação é muito difícil ou quase impossível.
CONTINUA…
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